quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Segredo


segredo-seo

Disparava-se, continuamente, pelas vielas do subúrbio. Pedaços de rua que entrecortavam os quarteirões permitindo observar as entranhas de uma cidade decadente. O céu noturno repleto de manchas - sem brilhos, com exceção, apenas, daquele buraco luminoso e vibrante - seguia o rapaz, iluminando seu sobretudo preto. Ele apertava o passo e girava outra esquina. A lua o perdera de foco, nada que em poucos segundos, outra virada para uma rua decente, não resolvesse. Com passos largos, mãos entre os bolsos, o homenzarrão caminhava firmemente pelos caminhos estreitos. O pensamento distante, repetindo-se constantemente em sua cabeça para não ser esquecido; não poderia. Seria uma imprudência tamanha esquecer-se de tais palavras, de tais afirmações…


- Corra! – Dizia o oficial de polícia. Não era uma ordem, e não havia o tom impetuoso e comandante, quase arrogante, dos oficiais que exerciam sua profissão: – Corra! Maldito impertinente. Nisso, um rapaz apareceu a porta do escritório.

- Chamou, senhor? – Ele, que até então, só tratava com papeis e correspondências na delegacia, recebera o chamado por intermédio de seus companheiros de trabalho, que o alertaram sobre o caso.

- Não! Ora, essa! Isso são lá perguntas que se faça? – o policial, devidamente fardado, com um traje azul escuro e um porrete balançando na cintura, foi até a mesa e remexeu nos papéis. O jovem coagido tratou logo de se redimir.

- Desculpe, senhor. Não foi minha… Ora, essa! Exclamou o oficial: – Deixa de churumelas e trate de saber por qual motivo está aqui.

- Então?…
- Eu o convoquei, porque você é a única pessoa que poderá fazer este serviço!

- Mas, senhor. Eu sou apenas um escri… Tolice! – O oficial o cortou novamente, entregando-lhe diversas folhas: – Nosso país precisa urgentemente dos seus serviços, recusa-se a ajuda-lo?

- Não, senhor. É que…  É que…

- É que, nada! Escute: O que vou lhe contar agora não deverá ser revelado a ninguém, somente ao destinatário, compreende?

- Sim, senhor.

- Pois bem…

O policial contou o que ele precisava fazer. Diante de tal informação, comprometeu-se seriamente a realizar a missão prontamente dita. Os papéis estavam escondidos dentro do casaco fechado para que não fossem vistos. Aumentando sua temperatura consideravelmente, já que o dia estava quente. Ainda sim, mantinha sua concentração, evitando distrair-se para não esquecer o que fora dito pelo seu superior. Embora suas ideias estivessem em outro plano, percorria devidamente o trajeto pelas vielas, sem se perder. Acostumado com tantas vezes que havia, por ali, passado. Enfim, chegando ao destino. Uma pequena casa de tijolos, com uma porta de madeira. Bateu.

- Em que posso ajudar? – Disse a moça, com a porta meia aberta.

- Desculpe-me o incomodo a esta hora, senhorita…. – passava-se da meia noite. – Me pediram para que lhe entregasse esses folhetos. – E assim, abriu o sobretudo e tirou as folhas amarrotadas do bolso, entregando-lhes a moça, que afirmou com a cabeça, num gesto que representava ter entendido a mensagem.
A porta se fechou e nenhum outro comentário foi dito. O rapaz de sobretudo voltara a vagar corriqueiro pelos estreitas ruas. Dessa vez, agilizando-se sem se preocupar se derrubaria algo em seu bolso ou não. “- Como pode alguém espionar, a essa hora da noite?”, indignava-se. Fora incumbido pelo oficial devido ao seu conhecimento da cidade, dizia ele:

- A única pessoa que me disseram, que morava por essas bandas, era o senhor. Como pode ver, estou preso aqui. Esses vigias não vão sair daqui tão cedo, e sinto que posso confiar no senhor, o que me diz?

- Sim. Ele respondera. Agora, talvez, se arrependesse; mas dizia para si que era uma tarefa digna.

Parou rente a uma porta de alumínio. Bateu, três vezes. Depois uma, e mais duas, numa espécie de código. A porta se abriu, e o moço adentrou na casinha. Conversaram, ele e outra moça jovial. Contou-lhe o que sucedera:

- Veja bem. O homem não pode vir pessoalmente, pois está sendo vigiado. Disse-me ele, que ela esta perseguindo-o o dia inteiro. Deixou seus comparsas á porta da delegacia, monitorando todos que entrassem e saíssem, e com o que carregavam. Seguiam todos que saiam, e se paravam na rua para dialogar com alguém, o interrogavam. Como pode notar, não há escrúpulos. Suponho que nem da parte dela, e nem da dele. Levei os papeis que me foram entregue: eram cartas. Convites. A moça que os recebera manteve-se em silêncio. Eu, girava e girava pelas vielas para que não me seguissem. Só a ideia de ter alguém atrás me observando, a noite, me dá calafrios. Vim até aqui por isso…

Revelou ,assim, o segredo que trazia consigo. Da delegacia, o policial saía de carro acompanhado por sua mulher.

- Viu só querida? Não há com o que se preocupar. – dizia, um tanto desconcertado.

- Sei. Ai de você, se eu descobrir que você está saindo com alguém!

- Precisava de tudo isso? – perguntou, francamente.

- Quem mandou se meter com uma detetive? Que quer que eu faça? É meu trabalho, faço o que faço, de melhor, para proteger meu marido!

E os dois seguiram, sem mais palavras. Embora o oficial se sentisse preso, sendo espionado por sua própria mulher, alegrava-se, internamente, pelo esforço que ela dispunha em sua preocupação.
Os dois chegaram, em seu respectivo lar; a moça foi abrindo a porta, pega distraída, pela multidão do lado de dentro, que começava a cantar…

- Parabéns pra você!

Surpresa, voltou-se para trás. Seu marido carregava em seus braços uma caixa de presente.

- Mas, como…? – Perguntou, com os olhos umedecidos. Emocionada.

- Meus atrasos nos dias anteriores, estava ajeitando tudo. Quase não conseguimos, quando você pôs se a me vigiar. Precisavam da minha ordem para que montassem tudo, mas não queria que descobrisse. “Maldito impertinente”. Desde manhã estava procurando uma solução… “Corra! Corra!”… então, resolvi enviar alguém no meu lugar. – E movimentando a cabeça, apontou para o rapaz de sobretudo, que já não o vestia mais.

- Eu pensei… eu pensei… – tentava se explicar, soluçando e chorando de alegria, envergonhada da atitude que tomara: – Eu pensei… Eu sei o que você pensou! O marido interrompeu: – Eu sei. Não se preocupe, vamos aproveitar essa festa. Afinal, hoje é seu aniversário!

E todos que estavam ali, comovidos com a cena, acordaram, de repente. Animando e agitando aquela festa surpresa.

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